quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014
Degustação Acadêmica
Visitei Oxford na semana passada. A cidade respira academia por todos os poros. Todos são estudantes, professores, pesquisadores. A cada esquina, um prédio histórico revela um departamento, uma biblioteca, ou uma sala de leitura. E, escondidos pela cidade, há passeios charmosos, em meio a jardins e campos, para caminhadas meditativas. Há uma aura de seriedade em todo ser que lá habita.
Eu estava, todavia, esperando ter um pouco de diversão. Meu cicerone havia me convidado para participar de um evento de degustação de vinhos. Segundo ele, um grupo de estudantes havia organizado uma sociedade degustadora de vinhos. Eles se reuniam todo sábado para duas rodadas de degustação. Enquanto os turistas veriam apenas a aura austera da cidade, eu estava esperando ter acesso à alma dela: os salões secretos, escondidos nos subterrâneos dos prédios, onde a máscara caia e rolavam verdadeiros carnavais. E eu, por mero acaso, teria acesso a uma dessas festas clandestinas e aguardava ansiosamente pela experiência.
E qual não foi minha surpresa ao encontrar um grupo de mais ou menos 20 estudantes, sentados comportadamente nas mesas, com suas folhas de anotações, aguardando o vinho ser servido. E assim foi. Durante duas horas, esses jovens de 19, 20, 21 anos, permaneceram calados, provando do vinho e fazendo anotações metódicas. Nada de festa. Nada de piadas. Nada de brincadeira. Ao contrário, o diálogo era sério e crítico, quando a instrutora do grupo questionava a avaliação que eles teriam feito do vinho tal ou do vinho qual. A maioria deles cuspia o vinho no baldinho. Ou seja, não era sequer uma embriaguez coletiva silenciosa o que estava ocorrendo ali.
Não me surpreende que tenha sido nessa cidade que algumas das mais criativas obras de literatura tenham surgido. C.S. Lewis e J.R.R. Tolkien são os melhores exemplos da literatura de fantasia que saiu desse lugar tão bem comportado. Lá, veste-se de forma elegante, porta-se de maneira impecável, conversa-se sobre temas de alta relevância intelectual, e bebe-se como se fosse um exercício de treinamento militar. Alguma hora, o que há de humano, orgânico e espontâneo dentro desses seres, por menor que seja, precisa se manifestar.
Até eu, depois daquelas duas horas de degustação verdadeiramente acadêmica, estava pronta para trombar com Harry Potter e um dragão na próxima esquina. Mas nem depois de 12 taças de vinho muito bem saboreadas eu consegui encontrar eles...
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