terça-feira, 31 de agosto de 2010

Meu pai, versão 6.2!

Meu pai veio -- finalmente -- me visitar no Canadá. E veio com uma surpresa: não era mais aquele profissional sério que me levava para a escola todas as manhãs, com a roupa impecavelmente passada e os sapatos pristinamente engraxados. O homem que chegou aqui era, ao invés disso, um senhor aposentado, de bom humor, de camiseta e tênis. Mais importante que isso, era uma pessoa que decidiu que era hora de aproveitar a vida. 


Se vocês estão duvidando, vejam por vocês mesmos.

 Meu pai em Quebec City, fingindo que faz parte da Guarda Real Montada.

Ainda em Quebec City, tirando sarro do fato de que todo mundo na família precisa ir ao banheiro a cada 5 minutos, então a gente está sempre procurando pela plaquinha...


Em Toronto, fingindo que é um aluno de direito, na sala onde eu dou aula. 


No cinema 3D de terceira qualidade que ele decidiu assistir com minha tia e meu tio, ludibriado pela promessa de que os óculos e o ar condicionado do cinema iriam reproduzir a experiência do inverno canadense.


 Em New York City, entusiasmadíssimo com o banheiro do nosso quarto de hotel, tirando empolgadamente fotos pra mandar pra minha mãe.


No táxi, ensinando minha tia como tratar dor de cabeça com do-in, sem se inibir com o fato de que as pessoas paradas do nosso lado no farol estavam todas se perguntando que diabo estava acontecendo.


Na porta do Blue Note, um clube de jazz em New York, para assistir o show da meia noite e meia. Nada mal para quem ia dormir às 10pm...


Na beira do Rio Hudson, bicicletando. 


No último dia da viagem, realizando o sonho de sobrevoar a big apple de helicóptero, mas acho que no fundo no fundo eu estava mais empolgada com o passeio que ele...



E, por fim, minha foto favorita: meu pai fazendo uma interpretação dramática das árvores no quadro do Van Gogh no restaurante do MoMA.


Assim como programas de computador, a versão aposentada do meu pai é infinitamente superior a todas as versões anteriores. E estamos todos aguardando ansiosamente as versões futuras, ainda por vir.

Valeu, pai!


segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Bom, bonito e barato na Big Apple

Depois de indicar as melhores extravagâncias gastronômicas (e financeiras) em NYC, ficam aqui minhas dicas de como comer bem na big apple sem ir à falência. 

1) Market Cafe: bom e barato, mas nada bonito. Não se iluda pelo website: a decoração é bastante precária. Como diz um comentário no google, não leve um "date" para esse restaurante. Mas a grande vantagem é que fica aberto até tarde: acabei jantando aqui porque eu e minha família decidimos sair pra jantar as 10:30pm e era o único local aberto em midtown Manhattan. E, para nossa surpresa, estava bom...

2) Não lembro o nome do segundo restaurante e não consegui achar o link, mas se você procurar o endereço da international food house, fica do lado (35th Street, entre a 7 e 8 Ave). É um restaurante de comida Latino Americana, mais particularmente Porto-Riquenha. A especialidade da casa é mofongo, que é um puré de banana da terra com bastante alho. Uma das resenhas do restaurante diz tudo: "it fits the bill and then some".




 E apesar da decoração não ser lá grandes coisas, a beleza dos pratos compensa: 




E o serviço é de excelente qualidade. 


3) Cafe 2: se você estiver no MoMA e achar que não vale a pena ir à falência para ter uma experiência gastrômica inesquecível no The Modern, suba no segundo andar.  O restaurante italiano do museu oferece pratos apetitosos a preços razoáveis.


Bon appetit!

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Um tapa sem luva de pelica

Recebi hoje a seguinte reclamação de J.

Já que vc é tão preocupada com políticas públicas, uma política salutar poderia ser parar de praticar a pirataria criativa e me dar crédito quando vc escreve um post com DOIS sites que eu te mandei...  Isso nem é plágio mais, é pirataria com papagaio no ombro e tudo!

Esclarecimento: agora foram três sites. Stuff white people like, o sujeito do moleskine, e o artigo sobre subsídios para personal trainers no Canadá.

Minha resposta: estou copiando o modelo chinês de desenvolvimento... Um país cujo PIB  cresce 10% ao ano por tanto tempo está fazendo alguma coisa certa nas suas políticas públicas. E com certeza eles não são contra a pirataria. Muito pelo contrário.

Curiosidades Canadenses - parte 1

Descobri esses dias que o governo canadense permite que seus cidadãos deduzam do imposto de renda qualquer massagem. Um artigo recente em um jornal de grande circulação aqui diz que o governo estaria gastando melhor o dinheiro se oferecesse deduções para que os cidadãos contratassem personal trainers e fizessem ginástica. Eu discordo. Como já disse antes, acho que a massagem aqui é um substituto para a falta de contato físico entre as pessoas no dia-a-dia. Portanto, para manter a saúde psicológica da população, é um ótimo investimento. 

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Achei que usava bem meu moleskine...

... mas esse cara me bateu, de longe. O que mais gostei foi ele completando o formulário no início do Moleskine. Como recompensa ("reward") para quem achar o mosleskine e devolvê-lo, ele oferece consciência limpa. Achei uma excelente proposta...


P.S. - Se você, assim como meu pai, não sabe o que é um moleskine, clique aqui.

P.S. 2 - Se você não entende porque a "juventude" de hoje anda toda atrás desse caderninho preto, a explicação está nesse site genial, chamado "stuff white people like".  Minha parte favorita é essa:


"Much like virtually everything else that white people like, these notebooks are considerably more expensive yet provide no additional functionality over regular notebooks that cost a dollar.  Thankfully, since white people only keep their most original and creative ideas in the Moleskine, many of them will only be required to purchase one per lifetime."

Esse maravilhoso mundo de Quebec City

 


Todo mundo sabe que Quebec City é cheio de monumentos e prédios históricos. Mas há pelo menos duas coisas que poucas pessoas te contam sobre essa cidade. A primeira é que há uma obsessão com gatos.

 

Obviamente, há outros animais também, mas eles sempre estão acompanhados pelos gatos.



E há gatos para todos os gostos. Gatos pintados a ouro, com os peitos de fora,

 

Gatos de vidro,


 
Gatos pintados no vidro,


 

E gatos em vitrines coloridas.

  

Perguntei para algumas pessoas porque havia tantos gatos retratados na artesania local. Nenhuma resposta foi satisfatória. Uma das artistas me disse que ela gostava de gatos. Mas parece que todos os artistas da cidade também gostam, e eu fico me perguntando como ocorreu essa concentração de artistas que gostam de gatos em uma única cidade. Trata-se de um grande mistério.

A segunda coisa que ninguém te conta sobre Quebec city é que apesar desta ser supostamente a cidade mais européia do Canadá, é muito difícil encontrar um local pra tomar café. Andei muito durante a tarde, em busca de uma cafeteria, mas encontrei apenas gatos. No meio da minha andança, já afetada pela crise de abstinência, encontro cogumelos gigantes no gramado.

 

Imediatamente pensei que tinha sido transportada para o País das Maravilhas da Alice, e estava pronta para encontrar um gato sorridente que falava... 

Mas voltemos ao problema do café (ou da falta dele). A dificuldade de se encontrar um café é tão grande que nem hoje na hora do almoço consegui um a contento. Ao pedir para a garçonete um machiato, encontrei uma cara de interrogação.

- Machi o que?
- Quero um espresso com um pouquinho de leite.
- Você quer leite no seu espresso (outra cara de interrogação)

Nesse momento pensei que se eu insistisse no machiato ia acabar com algo intragável, como uma xícara gigantesca de leite frio com meu espresso no meio. Decidi me conformar com meu destino.

- Pode trazer um espresso mesmo.

O meu drama só chegou ao fim quando eu encontrei um vendedor em uma loja de artesanato que era francês. Perguntei pra ele onde eu poderia tomar café no meio da tarde.

- Bom, tem um starbucks descendo essa rua.
- Não. Starbucks, não. Por favor.

O moço abriu um sorriso de cumplicidade. Sim, nós dois fazíamos parte da minoria silenciosa que não acha que o café do Starbucks é bom. Foi nesse momento que ele decidiu compartilhar comigo a localização do que parece ser o único local na cidade onde se pode tomar um café bom no meio da tarde.

- Tem um café excelente, chamado Chez Temporel, na Rue Corillard.

Era exatamente o que eu estava procurando. Um local pequeno, simples, em uma ruela sem turistas, e com um café delicioso. Fiquei pensando se o fato de que a loja do francês não tinha gatos estava de alguma forma ligada ao fato de que ele sabia onde tomar um bom café. Seria ele uma das poucas pessoas sãs nessa cidade? 

Mas não demorou para a xícara acabar, esse pensamento de esvair, e eu ser tragada de volta para o País das Maravilhas de Quebec. Depois do almoço no restaurante do Porco Dourado - sem direito a machiato - estou indo jantar no restaurante do Coelho Veloz. Será que alguém podia me acordar desse sonho? Se possível, por gentileza, tragam uma xícara de café. 
 

domingo, 1 de agosto de 2010

Será que eu cheguei na idade?

Agora que chegamos todos nos trinta e poucos ouço meus amigos dizendo "já passei da idade" com mais frequência do que costumava ouvir. A frase em geral vem acompanhada de alguma ilustração de um momento em que a pessoa perdeu as estribeiras, ou saiu da linha ou foi, no mínimo, indelicada. A desculpa -- até onde entendo -- é que depois de uma certa idade você já engoliu tanto sapo na vida por causa do que é "socialmente aceitável" que você descobre que o custo de mandar tudo às favas é menor que os potenciais benefícios. A essa altura, provavelmente mais de um terço das nossas vidas se passou. Alguns provavelmente já estão na metade dela. Portanto, é melhor começar a aproveitar...

Eu fico me perguntando se eu já cheguei na idade de "passar de idade", ou se, na verdade, eu nem sequer preciso passar da idade pra fazer coisas socialmente inaceitáveis, pois eu nunca na verdade me importei muito com códigos sociais. Alguns exemplos recentes dão margem pra dúvida.

Primeiro, quando eu estava na Itália, eu me via obrigada a andar debaixo de um sol de rachar o dia inteiro. Não tinha chapéu e protetor solar que aguentasse. Decidi então usar o conhecimento milenar que adquiri na minha viagem à China: se o sol tiver muito forte, abra sua sombrinha. Sim, a sombrinha. Quando vi isso na China, achei a solução genial. É como ter uma sombra privada, que fica te seguindo por todo lugar. É como se você contratasse uma árvore pra te seguir, sem a inconveniência de ter que lidar com pessoas estupefadas na rua pelo simples fato de que tem uma árvore te seguindo. E, para meu consolo, todas os asiáticos visitando a Itália, especialmente as mulheres, não hesitavam em abrir suas sombrinhas debaixo do sol. Portanto, eu não tinha sequer que lidar com pessoas estupefadas com uma estrangeira com a sombrinha aberta debaixo daquele solão...


Segundo, ainda quando eu estava na Itália, em um jantar pedi um prato especial com um macarrão "grano duro" e caranguejo. Para minha surpresa, recebi um prato cheio de macarrão com molho de tomate, e metade e uma caranguejo inteiro em cima do macarrão. Quem já comeu caranguejo vai entender o problema: quebrar as patas e o corpo do caranguejo pra comer a carne não é um trabalho fácil. O trabalho torna-se especialmente difícil se você não tem uma tábua e um pauzinho pra martelar a "casca" do caraguejo. Pela fortuna que eles estavam me cobrando pelo prato, achei uma sacanagem que eles transferissem pra mim o trabalho de tirar a carne de dentro do caranguejo. Eu podia, claramente, ter me portado como uma donzela e ter comido meu macarrão civilizadamente, deixando o caranguejo de lado. Mas pelo preço que eu estava pagando, eu achei que eu tinha direito à carne do caranguejo. Por causa disso, decidi catar o caranguejo e quebrar a casca com o dentes, tirando a carne de dentro com as mãos ou a boca. Não preciso dizer que a cena foi especialmente desagradável se você considerar que o caranguejo estava mergulhado em molho de tomate. Mas, pensei, pelo preço que eu tava pagando, eu ia comer aquela carne quer eles quisessem, quer não. No meio do episódio, o garçom se limitou a me trazer uma bacia de água quente com limão, pra eu limpar meus dedos. E eu imagino que o chef deve ter tirado o prato do cardápio depois da minha passagem pelo restaurante. Mas eu não ia ficar sair de lá sem comer minha carne de caranguejo....

Por fim, esses dias um colega meu brincou com o outro falando que nós tinhamos um "date", quando estávamos saindo pra almoçar. O outro respondeu que era provavelmente por isso que eu estava "chique". Respondi que eu não estava chique, mas que meu vestido provavelmente era a peça mais barata no meu armário (vestido de algodão da Marisa...). Quando uma colega minha do clube de corrida disse que eu estava "chique" quando me viu com o mesmo vestido, eu esclareci novamente que era um vestido barato de uma loja vagabunda, e contei a história do meu colega. Eu queria entender porque as pessoas achavam que eu estava chique. Daí minha colega explicou que provavelmente meu colega não estava fazendo um comentário sobre o vestido em si (como ela estava), mas que ele estava brincando comigo. Era como um jogo: um afirmava que era um date, e o outro entrava na brincadeira falando qeu eu estava chique. Para participar da brincadeira, eu devia ter sacaneado meu colega que não estava suficientemente "chique" para o date. Ao invés de fazer isso, eu interpretei literalmente a afirmação e fui contestá-la pra me certificar que todo mundo sabia que aquilo não era um date.

Todos esses exemplos podiam ser explicados pelo famoso "passei da idade". Mas eu tenho também explicações alternativas que acho igualmente plausíveis. No primeiro caso, por exemplo, eu acho que quando alguém viaja muito fica muito mais flexível e aberto ao que é aceitável e o que não. O que vestir, o que falar, e como se portar na rua são coisas que variam muito de país para país. E quanto mais você viaja, mais você vê a relatividade de uma séria de valores que você assumia serem universais e absolutos. Sombrinha na rua é apenas um dos muitos exemplos que eu consigo pensar. 


No segundo caso, eu estava jantando sozinha, no exterior, e a probabilidade de encontrar alguém conhecido era mínima. Obviamente eu não teria feito o que fiz se estivesse jantando com contatos profissionais. Portanto, anonimidade ajuda. Ainda que estivesse sozinha, acho que eu teria dificuldade de fazer o que fiz em Toronto. Saber que não vou ver nenhuma daquelas pessoas de novo na vida também é um grande incentivo.


No terceiro caso, eu podia dizer que já passei da idade de ficar fazendo brincadeiras. Mas acho que a verdade é que eu nunca cheguei na idade. Eu tenho uma tendência a interpretar literalmente tudo que me dizem. As pessoas brincam falando que "eu levo tudo muito a sério". Acho que, na verdade, eu interpreto tudo muito literalmente. Não sei se faço isso por causa da ascedência portuguesa, ou por algum outro tipo de distúrbio. Por exemplo, eu tenho vários sintomas de Asperger, que é uma forma de autismo que não afeta a capacidade cognitiva ou intelectual, mas afeta a interação social. Uma descrição de um dos sintomas bate exatamente com a situação que eu descrevi: "A capacidade cognitiva de crianças com síndrome de asperger frequentemente permite que elas articulem normas sociais e mostrem compreensão teórica de emoções de terceiros, mas essas crianças tem dificuldade de agir com base nesse conhecimento em contextos mais fluídos, em situações reais de interação social. As pessoas com a síndrome normalmente analisam a interações social e transformam suas observações em regras rígidas de interação, que elas aplicam de maneira estrita, criando estranhamento." 

 Acho incrível como essa é uma descrição perfeita do que eu estava fazendo: pegando a explicação da minha colega, quebrando ela a criando regras rígidas de interação social. Minhas tentativas de fazer isso sempre criam posts interessantes para o blog, mas quando eu tento usar isso para guiar meu comportamento, obviamente dá errado e é constrangedor pra todo mundo... E tentando driblar uma outra característica de asperger, que é sair falando sem considerar se o interlocutor está interessado, vou poupar vocês da longa lista de outros sintomas que eu tenho de asperger.
 
Em suma, eu não sei se tudo isso aconteceu porque eu já "passei da idade". Talvez outras circunstâncias expliquem melhor esses episódios. No último exemplo, em especial, acho que talvez eu nunca "passe da idade" de ficar participando de "jogos" sociais simplesmente porque eu nunca aprendi a fazer isso. O problema é quando essa incapacidade se juntar ao tipo de atitude do "já passei da idade". Acho que aí vai ser complicado interagir comigo. Até lá, fica a dica: se eu levar a sério alguma brincadeira, não é nada pessoal...