Último dia de viagem. Eu tinha que fazer o check-out as 11 da manhã e pegar um vôo para Costa Rica meia noite. Ou seja, as minhas opções eram vagar pelas ruas de San Francisco, homeless, carregando uma mala e procurando algo pra comer, ou... ir para um wine tour. Achei que a segunda opção combinava mais comigo. O boneco de cera e a Vespa na entrada da primeira vinícola pareciam confirmar minha premonição....
O que eu rapidamente descobri, todavia, é que quanto mais bonita a vinícola, pior o vinho. Acho que quanto menor a capacidade deles de produzir vinho bom, mais eles investem em infrastrutura.
Ou seja, se você entrar em uma vinícola na qual construiram uma fonte na frente da plantação, e portais que tentam reproduzir os monumentos italianos, se prepare para tomar um dos piores vinhos da sua vida.
Por outro lado, se você entrar em uma vinícola que têm uma casa simples, um jardim bem cuidado e uma construção histórica, da época das missões, que foi preservada, se prepare para um vinho bom.
Mas apesar dos vinhos ruins, a viagem foi divertida. Não sei se eles se coordenaram ou não, mas cada guia dava uma informação diferente sobre a razão pela qual as vinícolas têm rosas plantadas no início de cada fileira de cada videira. O primeiro falou que era para identificar a cor da uva: rosa branca, uva branca, rosa vermelha (ou rosa), uva vermelha. O segundo disse que não era nada disso, que o propósito era meramente decorativo. O terceiro disse que era por causa das pragas: como as rosas são muito sensíveis, elas pegam a praga primeiro, e dão tempo do dono da vinícola passar inseticida na plantação antes de perder todas a safra. O motorista do ônibus, em contrapartida, disse que esse negócio de praga era balela, pois as pragas que atacam videiras são distintas das que atacam roseiras. Ficamos todos, inclusive eu, sem saber em quem acreditar...
O debate sobre as roseiras não deixa de ser, todavia, um modo interessante de organizar uma excursão turística. Sempre nessas excursões ouve-se apenas uma versão da história e as pessoas acabam guardando a informação como se fosse verdadeira, sem checar. Ou seja, fala-se muita besteira e ninguém é punido por isso.
Nessa excursão, em contraste, eles conseguiram dar a todos um gostinho do que é o trabalho acadêmico. O pesquisador lê tudo sobre um assunto e acaba descobrindo que várias pessoas têm várias versões ou análises sobre um mesmo tema. O que fazer para descobrir quem está certo? Já adianto que colocar no google não adianta: todo tipo de informação que você encontrar tem o mesmo problema das informações que foram dadas na excursão. Não dá pra determinar qual está correta. A partir daí, o trabalho do pesquisador é desenhar um método que consiga testar as hipóteses e descobrir qual tem mais evidência para sustentá-la. E aqui vai uma regra importante: é quase impossível provar que uma coisa é certa e outra é errada. A maior parte do trabalho acadêmico, em especial o trabalho científico, é descobrir o que é mais provável. Segue meu vídeo preferido sobre o assunto:
Para os que estão achando que eu me embriaguei e estou desviando completamente do assunto, se enganam. Por muito tempo se acreditou que eram os deuses que convertiam o suco de uva em vinho. Um dia um cientista resolveu investigar o que estava acontecendo e, com a ajuda de um microscópio viu que a levedura transformava o açucar da uva em álcool. E depois dessa descoberta, ficou mais fácil tentar manipular o processo para produzir vinhos de melhor qualidade - adicionando mais açucar ou controlando a ação da levedura. Antes disso, sua única opção era acender umas velas. Ou seja, graças à ciência não estamos mais à mercê de deuses geniosos...
Mas voltando às vinícolas: as informações sobre os tonéis de carvalho (em contraste com as roseiras) foram bastante coerentes. Eles custam muito caro (cerca de 3.000 dólares cada), duram de 3 a 5 anos e depois seguem para destinos incertos. Ele vêm de todas as partes do mundo -- especialmente europa -- e contribuem para uma porção significativa do gosto do vinho. Fiquei pensando se o pessoal que construiu a fonte acabou economizando nos tonéis. Isso explicaria porque o vinho deles era tão ruim...
Além do vinho e das explicações sobre o processo de produção do vinho, o tour também teve lojinhas com produtos interessantes, como esse segurador de copo, caso você precise deixar suas mãos livres para alguma outra tarefa...
E cartões inspirados por temas relacionados a vinho, como este cartão boêmio:
A excursão também incluiu visitas a prédios históricos, como este, da época das missões espanholas. Os missionários católicos da ordem franciscana vieram para a costa do Pacífico apoiados pelo governo espanhol para colonizar a região e converter os nativos ao cristianismo. Por isso que tantas cidades aqui tem nomes em espanhol... Esse é o prédio da última missão.
E a excursão terminou com uma bela vista da cidade de San Francisco, com a outra ponte que atravessa a baía, que eu esqueci o nome.
Ou seja, no fim das contas, valeu a pena ir na excursão. Ao invés de passar o dia carregando minha mala e procurando algo pra fazer, passei o dia bebendo vinho e tendo minha curiosidade instigada pelos guias locais. Além disso, aprendi mais um pouco sobre a história da região e sobre o processo de produção de vinhos. Sabia que dá pra fazer vinho branco com uva vermelha? Pois é. Se quiser saber como, procure no google. Quem sabe você dá sorte e acha a resposta certa.