terça-feira, 26 de junho de 2012

Girls just wanna have fun!

Essa semana o feminismo me atacou, de todos os lados, desesperadamente pedindo para entrar no blog. De fato, faz um tempo que eu não escrevo um dos meus bravados feministas , em prol de igualdade, contra discriminação, blá blá blá. Acho que feminismo ficou carente e resolveu aparecer na minha vida de todas as formas possíveis para ver se ele ganhava um espacinho aqui. Vai ganhar o espaço, como esse parágrafo denuncia. Mas, sinceramente, não estou com muita vontade de levantar a bandeira e pegar as armas de novo. Esse negócio de ficar tentando mudar o mundo dá muito trabalho... 

Aos 35 anos, acho que estou começando a economizar minhas energias para outras coisas, tipo um jantar com os amigos, ou um excelente livro, ou um blog post acompanhado de um bom vinho. Segue, portanto, um relato da minha semana inundada de feminismo, regado a Syrah do Valle de Aconcagua, Chile. 

Assisti na sexta-feira a nova animação da Pixar, Brave. A heroína da história é uma princesa que não quer ter um casamento forçado e prefere fazer "coisas de menino". Ela quer atirar de arco e flecha e andar a cavalo, ao invés de ficar bordando no castelo e aprendendo como usar os talheres à mesa. Ainda bem que alguém resolveu dar uma opção para as pobres crianças inundadas com princesas que usam rosa, ficam penteando o cabelo e esperando o príncipe encantado. 

A Riley agradece!



Só achei ruim que em Brave a heroína tem que passar o filme todo brigando com a mãe para conseguir de fato ser a heroína. Será que não dava para ela simplesmente ser descabelada, tem um vestido azul e sair pelo mundo lutando contra o mal, ou salvando o príncipe encantado?


Daí veio todo o debate sobre o artigo da Anne-Marie Slaughter - Why Women Cannot Have it All -- sobre o fato de que as mulheres não pode ter tudo (i.e. uma carreira bem sucedida e dedicação à vida familiar).



O artigo é longo, e quem tiver paciência e tempo para ler tudo por favor me conte o que ela diz. Eu só li a primeira página, onde ela argumenta que estamos vendendo para as "working mothers" (mães no mercado de trabalho) uma grande ilusão. 


Grande novidade! Não preciso de um artigo deste tamanho para saber disso. Basta eu olhar para as mulheres que viraram professoras de direito aqui em Toronto pra ver. A vasta maioria não tem filhos antes de ganhar tenure (estabilidade no cargo). Depois do tenure, para algumas só resta a opção de adotar, por causa da idade. Adotados ou não, os filhos reduzem drasticamente a produção acadêmica daquelas que embarcam na aventura, que não são todas. Enquanto isso, os homens estão lá tendo filhos e produzindo feito um loucos... 


Por isso que eu decidi que a melhor versão do feminismo que encontrei essa semana foi esse vídeo:







Afinal, depois de uma certa idade, a gente começa a se divertir e delega a tarefa de mudar o mundo para os outros. Boa sorte para a Anne-Marie e o pessoal da Pixar!



 

terça-feira, 19 de junho de 2012

Não Entendo Esses Americanos

O aeroporto da cidade do México fede. Tem cheiro de vômito. Eu não sei se eles usam algum produto de limpeza muito questionável, ou se eu dei azar de chegar na ala do check-in no exato momento que alguém tinha tido um acidente (que não estava visível). Mas o ponto é que eu estava com pressa para fazer o check-in e sair dali para um local mais arejado o mais rápido possível.
Não havia fila e eu fui direto para o balcão. O sujeito pegou meu passaporte e, antes de perguntar meu destino, começou a bater-papo com sua colega no balcão ao lado, que estava à toa e recebeu muito bem o convite para conversar. Eles estavam falando muito rápido para eu entender o que discutiam, mas claramente não era trabalho, pelas risadas dele e pelos gestos exagerados dela em resposta. Comecei a perder a paciência e fuzilar o sujeito com meu olhar, mas ele estava tão ocupado com a conversa que não notou.
Daí tirei minha caderneta da bolsa e comecei a anotar o nome dele, visível no crachá, para reclamar com a companhia. Ele imediatamente percebeu o que eu estava fazendo e prontamente se desobrou em gentilezas, tentando ser simpático. Mas era tarde demais. Minha paciência já tinha se exaurido há um tempo e eu fiz questão de cortá-lo a cada investida. Ser gentil agora não iria me dissuadir da idéia de reclamar com a companhia aérea sobre a falta de profissionalismo dele.
E daí ele tentou sua última cartada: imprimiu meu cartão de embarque e me mostrou que eu estava na classe executiva. Por um momento, ponderei minha ameaça de reclamação. Talvez eu até tivesse deixado o incidente passar batido depois dessa, exceto pelo fato que o sujeito estava tão preocupado em me agradar que esqueceu de checar para onde eu ia. Ele imprimiu apenas o cartão de embarque do primeiro destino, Texas, sem minha conexão para o destino final, Toronto. Ou seja, se eu não checasse isso, ia perder minha conexão com certeza… Depois de fuzilar ele com meu olhar novamente, pensando que tinha muita gente desempregada no México que faria aquilo muito melhor que ele, sai o mais rápido que pude daquela sala fedida, para bem longe da presença daquele sujeito incompetente.
Daí eu chego nos Estados Unidos e a interação é o exato oposto. Os funcionários da companhia não olham pra mim, nem se olham entre si. Ninguém fala com ninguém. Nenhum sorriso. Nenhuma gentileza. Tudo rápido e eficiente, mas sem valor nutricional para a alma. É como fast food. Tudo bem que a cultura Mexicana gera ineficiência – sendo o imbecil do check-in o exemplo extremo – mas devo conceder que é bastante agradável ser tratado com um pouco de cortesia e um sorriso de vez em quando.
E foi por isso que eu me assustei quando pedi comida no vôo de Texas para Toronto e a aeromoça discretamente acenou com a mão, em um gesto meio furtivo, falando para eu colocar o cartão de crédito de volta na bolsa. 


Parenteses para aqueles que não viajam há algum tempo: as empresas aéreas americanas não servem mais nada no vôo, a não ser na primeira classe. Se você estiver com fome, tem que comprar os snacks horríveis que eles têm. Como dizem em ingles, “they added insult to the injury”. Não bastava servir comida ruim. Agora a comida é pior do que era antes, e você ainda tem que pagar por ela! 


Os precavidos forram o estômago antes de embarcar, mas como eu não tive tempo pra comer algo no aeroporto, entre as conexões, só me restou a opção da comida paga do avião. E lá estava eu me preparando para pagar quando a aeromoça americana decide me dar a comida horrenda de graça.
Eu passei o resto do vôo especulando o que teria levado aquela senhora a me fazer aquela gentileza (ainda que seja comida horrenda, eu estava com tanta fome que classifica como gentileza…). Essas eram as hipóteses:
1)    Eu lembrava ela de algum parente com qual ela perdeu o contato há anos. Talvez uma filha que fugiu de casa para virar hippie. Ou uma neta, que se perdeu no mundo das drogas e nunca mais deu sinal de vida.
2)    Eu era a única pessoa no avião com o computador aberto e pilhas de papéis empilhadas, visivelmente estressada. Em contraste, a maioria dos passageiros estava indo ou voltando de férias, assistindo filmes nos seus iPads, lendo seus livros no Kindle, ou usando o método antiquado -- e já quase em completo desuso -- de entretenimento: falar com a pessoa no assento do lado. Talvez ela tenha ficado com pena de mim, ou se identificado comigo – afinal nós éramos as únicas pessoas dando duro ali.
3)    Eu fui a última pessoa que ela serviu, e ela fez a gentileza porque as três coisas que eu tinha escolhido no menu não estavam disponíveis. Daí tive que me conformar com o que tinha e ela resolveu me dar um brinde, como cortesia da empresa.
Ou seja, não sei se ela fez isso por ela (1), por mim (2), ou pela empresa (3), mas o fato é que todas as minhas tentativas de interagir com ela depois disso, para agradecer a comida, ela reagia como se não soubesse do que eu estava falando. Ou seja, a reação dela não correspondia com nenhuma das hipóteses.
São nesses momentos que eu me sinto bastante latino-americana. Talvez eu possa não gostar delas, mas ao menos eu sei as regras de interação e como elas funcionam. E o bom da interação latino-americana é que o objetivo é sempre muito claro. O exemplo do atendente mexicano ilustra bem isso: ele queria ganhar minha simpatia e evitar o problema com o chefe. Outro exemplo foi um comissário de bordo brasileiro que me trouxe um sundae com calda de morango diretamente da primeira classe. Por que? Porque eu era a única brasileira em um vôo de Israel para Nova Iorque e o mineiro ficou tão feliz de encontrar uma candanga, no meio de tantos gringos, que resolveu confraternizar… Enfim, seja pela razão que for, com os latino-americanos você com certeza vai ficar sabendo qual é a razão e porque você está ganhando algo de graça...
Mas, ao contrário dos latino-americanos, a aeromoça norte-americana me deixou lá sem saber o que estava acontecendo! Só depois da diarréia que eu tive no dia seguinte ao vôo, encontrei uma melhor hipótese: a comida que ela me deu era a pior opção, dentre tudo que havia de horrendo naquele vôo. Portanto, ela não apenas se sentiu envergonhada de me cobrar, mas ela também não achou que tinha me feito favor algum de me servir aquilo.
E depois de passar uma semana com diarréia, eu decidi que assumir minha "brasilidade" é a melhor arma contra esse capitalismo selvagem norte-americano. Vou levar meu frango com farofa – sem salmonela – no próximo vôo e se algum americano reclamar, eu rodo a baiana na cabeça deles!

terça-feira, 5 de junho de 2012

Dr. T.


Para aqueles que lêem inglês e apreciam bom humor, recomendo a leitura do blog da Dr. T.

E informo meus leitores que estamos correndo o risco de perder os comentários fiéis e infalíveis de Dr. T. neste blog, dado que agora ela está ocupada com seu próprio blog. 

Mas é para o bem da humanidade. Então a gente deixa. 

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Aloha!


Encontros e desencontros é o título de um filme de Sofia Coppola, que em inglês chama-se Lost in Translation. Essa é mais uma dessas expressões idiomáticas que não tem sentido quando se faz uma tradução literal. "Perdido na tradução". Soa estranho, não?

Hoje eu me deparei com outra expressão que é difícil de traduzir. Conheci uma pessoa que nasceu e cresceu na Califórnia, mas decidiu se mudar para o Havaí há alguns anos atrás. Falei que ela havia se mudando de um lugar lindo para um lugar ainda mais lindo (onde eu me encontro nesse exato momento). E ela me disee, "I moved from heaven to paradise". Eu não consegui traduzir a expressão. Tanto heaven quanto paradise são frequentemente traduzidos como paraíso. Tentei procurar no google "do céu ao paraíso", para ver se a distinção fazia algum sentido. Confesso que abandonei o catecismo aos 9 anos de idade, e assumi que tinha uma distinção entre os termos que eu não tinha aprendido, mas a única coisa que encontrei foi essa pedra preciosa (ou esse gênio da raça, como diz meu amigo A.):


(Esse não se perdeu na tradução. Ele já tava perdido muito antes disso!)

Mas o termo mais confuso na minha cabeça no momento é Aloha. Aqui no Havaí, eles colocam Aloha em tudo: cartazes, entradas de hotel, menus de restaurante, etc, etc. Além disso, todo mundo te diz Aloha quando você chega em algum lugar. Na minha tentativa de advinhar o que significava isso antes de ter acesso ao grande mestre Google no hotel, criei a hipótese de que o termo significava bem-vindo. 

Errado! 


Segundo a wikipedia, nossa fonte insaciável de sabedoria, em Havaiano (se for esse o nome da língua nativa aqui) o termo Aloha significa apego, paz, compaixão e perdão. Ou seja, aquele "tudo de bom" que a gente deseja para as pessoas quando quer abreviar a longa lista de bons desejos. Daí vieram os colonizadores, se apropriaram do termo, e passaram a usar Aloha para dizer oi e tchau. De acordo com a Wikipedia, hoje em dia o termo é primordialmente usado como "olá". Afinal, colonizador que se preza não fica desejando coisas boas para as pessoas a torto e a direito (e boa sorte para quem se aventurar a traduzir essa expressão -- a torto e a direito --para o inglês!).

A wikipedia certamente explica as pessoas me comprimentando com Aloha em tudo quanto é lugar. As pessoas são genuinamente simpáticas aqui e sempre dizem Aloha abrindo um sorriso e puxando papo de uma maneira tranquila e não interessada (ou seja, eles não estão tentando me vender algo, nem me roubar, nem pedir uma ajuda...). Mas a wikipedia não explica a versão escrita do termo em todos os outros lugares. Você escreveria "Olá" no topo do menu se estivesse abrindo um restaurante? E colocaria um placa na entrada do seu hotel 5 estrelas no Leblon dizendo "Oi"? Não, né?

A coisa fica ainda mais confusa porque a língua nativa é usada em todo lugar, junto com o inglês. Ou seja, não dá pra saber se estão usando Aloha em inglês (olá) ou em havaiano (tudo de bom).





(E como vocês podem ver, as imagens universais também são traduzidas nas imagens nativas...)

Ou seja, parece que Aloha às vezes é usada como "olá", outras como "tudo de bom". Todavia, o que a wikipedia não fala é que, por vezes, as empresas se apropriam do termo e usam ele sem significar nem uma coisa nem outra. Sim, você entra no Hilton e vê um Aloha na entrada. A mesma coisa com o menu do Starbucks. Acho que as pessoas precisam ser constantemente lembradas de que estão nesse paraíso que é o Havaí, apesar de estarem tomando o mesmo café que tomam todos os dias, comendo a mesma comida, e dormindo em um um quarto idêntico a todos os outros quartos de hotel que essas pessoas se hospedaram na vida. Acho que essa é a mesma razão pela qual usa-se a língua local em todo lugar e vestem os bonequinhos do sinal de banheiro com trajes típicos.

Ou seja, acho que alguém precisa entrar na wikipedia e escrever que hoje o termo tem também um terceiro significado: 

Aloha: "lembre-se, turista, mesmo quando você não está de frente para a paisagem estonteante das praias havaianas, mas sim vivendo a mesma vida que você vive todo dia em qualquer lugar dos Estados Unidos, você ainda está no Havaí!"

domingo, 3 de junho de 2012

A arma do crime

Quando entrei no banheiro do hotel e vi as toalhas brancas e a pia toda manchada, fiquei atônita. Parecia que uma guerra havia acontecido ali e, durante a confusão, ninguém conseguiu conter muito o dano. Meu pai, quase em pânico, me dizia que tinha decidido usar o banheiro para não sujar o quarto do hotel, mas ao tentar cortá-la, aquele líquido de cor fuzilante espirrou para todo o lado, deixando o banheiro na situação em que se encontrava.

- Precisamos limpar tudo, antes que o pessoal da limpeza veja isso! Falei, tentando não me deixar afetar pela cena de horror que presenciava.

E começamos a limpeza.

Mas diferentemente de outros líquidos, facilmente removíveis com água e sabão, aquele deixou sua marca em todos os cantos do banheiro. Por mais que lavassemos as toalhas, elas continuavam manchadas. Mas o pior era a pia. Ainda que os tons mais fortes saíssem com relativa facilidade, os resíduos permaneciam lá, como se tivessem penetrado nos poros da pedra e se recusassem a sair. Ou seja, as evidências – ou reminiscências -- do que tinha acontecido permaneciam no lugar, por mais que tentássemos removê-las.

Enquanto limpava, pensava como tínhamos chegado nesse ponto. Lembrei então que tudo começou com minha faxineira trazendo a arma do crime na sua bagagem, quando voltava da Jamaica. Pensei que ela teria algum esquema bem bolado para esconder a dita cuja, mas ela simplesmente colocou-a na mala, sem maior cerimônia. E assim a arma chegou as nossas mãos, em território canadense, sem ser confiscada pelas autoridades que supostamente devem fiscalizar os aeroportos e outros pontos de imigração. Chegou mais por sorte do que por mérito da nossa courier, mas ainda assim chegou. Uma mistura de medo e animação tomou conta de mim. Pensei como a facilidade de contrabandear coisas ilegais abre um mundo de possibilidades para mim, e fico animada. Penso, todavia, que as mesmas possibilidades estão abertas para outras pessoas, de reputação menos ilibada e que podem ser ainda mais perigosas para a saúde pública e a paz social do que eu. Daí o medo. Ao olhar para aquele banheiro naquele estado, todavia, pensei se de fato eu estava no grupo de pessoas com reputação minimamente ilibada...

Não olhei no relógio para ver quanto tempo havia durado a limpeza. Não queria também pensar no que aconteceria se alguém descobrisse o que havia acontecido ali. Fiquei, durante aquele tempo todo, focada no objetivo principal: eliminar todo e qualquer resquício do evento. Ao final do processo, meus músculos doíam. Mas o banheiro parecia estar de novo limpo. Ao menos não levantaria suspeitas do ocorrido naquele quarto hotel, do qual sairíamos na manhã seguinte. Meu momento de alívio, todavia, foi interrompido por um pequeno pânico. Ao olhar para a lata de lixo vejo ali, totalmente à mostra, a arma do crime. Decidi fechar o saco de lixo e levá-la para o carro. O odor ainda era forte e certamente ficaria pior se passasse a noite ali. Decidimos descartá-la na estrada, em algum lugar distante, no dia seguinte.

Até o momento, posso afirmar que cometemos o crime perfeito. Permanecemos incólumes. Ainda assim, vou pensar duas vezes antes de deixar meu pai comer manga jamaicana no banheiro do hotel da próxima vez que ele vier ao Canadá.

Nota: Essa é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com locais, pessoas ou acontecimentos reais não passa de mera coincidência.