segunda-feira, 23 de setembro de 2013
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
Procurando Plantas Perenes
Hoje eu descobri que os jardins do Canadá tem dois tipos de plantas: perenes e sazonais. As perenes são as plantas típicas do Canadá, que coseguem hibernar por seis meses ou mais e florescem de novo quando o gelo derrete e a primavera finalmente dá o ar da graça. Já as sazonais são aquelas importadas dos trópicos. Não sobrevivem ao inverno. Portanto, elas morrem e são substituídas por uma nova leva de plantas sazonais, compradas em alguma floricultura, na próxima primavera.
Manter uma planta viva para mim é um trabalho hercúleo. A lista de plantas que eu matei provavelmente serviria para me condenar a muitos anos de prisão se houvesse um tratado internacional ou alguma lei protegendo o direito das plantas à vida. A acusação não poderia ser de homicídio doloso porque eu nunca tive a intenção de matar as plantas. Mas certamente poderia ser acusada de homicídio culposo, pois eu sabia que eu não tinha habilidade para cuidar de plantas quando adquiri as mesmas. Ou seja, eu claramente assumi o risco de matá-las.
Daí vem esse povo canadense me dizer que eles não apenas conseguem manter as plantas vivas, mas depois de todo cuidado, carinho e investimento feito nelas, eles simplesmente largam as plantas lá fora para congelarem nesse inverno desumano.
Eu não sei vocês, leitores, mas pra mim tem muitas coisas erradas com isso.
Primeiro, acabei de ler um livro do Dan Ariely sobre como a gente valoriza mais do que as outras pessoas as coisas que possuimos e das quais cuidamos. Por exemplo, se eu vou comprar uma mesa, o preço que estou disposta a pagar por ela é menor do que o preço pelo qual eu estaria disposta a vend6e-la. E isso ocorre simplesmente porque a partir do momento em que eu me torno proprietária, a mesa passa a valer muito mais pra mim do que valia antes, apesar de se o mesmo objeto. Se eu tiver construído a mesa a coisa fica ainda pior: vou colocar um preço ainda mais alto nela. E daí vem esse povo todo comprar plantas, colocar adubo, regar todos os dias, se certificar que a quantidade de luz está certa, ver a planta florescer e crescer. E daí eles simplesmente deixam ela morrer! Não sei o que estão ensinando para as crianças na escola aqui, mas os experimentos de economia comportamental dizem que a maioria das pessoas não iria topar uma empreitada dessas.
Segundo, acho uma sacanagem com a planta. Ela tá lá feliz e contente debaixo do Equador. Daí você promete pra ela uma vida muito melhor, dizendo que ela vai para um país cheio de adubo, com pessoas que tomam conta dela todos os dias. E quando a planta chega aqui, usufrui dessa vida maravilhosa por cinco meses, só para descobrir sua sentença de morte. Se essa planta tivesse lido o Pequeno Príncipe, tenho certeza que ela estaria lá, olhando as temperaturas cairem e te dizendo: "você se torna responsável por tudo aquilo que cativa"...
Por fim, gente que desapego é esse? Não tenho estrutura emocional pra isso. Não sei se o povo aqui é budista, ou tem alguma outra religião que permite esse desprendimento, mas eu ia precisar de muita terapia pra deixar uma planta para a qual eu me dediquei tanto morrer assim.
Me disseram que esse é o preço que se tem que pagar por flores aqui no Canadá. Pois eu me recuso a lidar com os custos financeiros, ambientais e emocionais disso. Estou, a partir de agora, em busca de plantas perenes somente. Afinal, alguém precisa ser sã nesse país.
Manter uma planta viva para mim é um trabalho hercúleo. A lista de plantas que eu matei provavelmente serviria para me condenar a muitos anos de prisão se houvesse um tratado internacional ou alguma lei protegendo o direito das plantas à vida. A acusação não poderia ser de homicídio doloso porque eu nunca tive a intenção de matar as plantas. Mas certamente poderia ser acusada de homicídio culposo, pois eu sabia que eu não tinha habilidade para cuidar de plantas quando adquiri as mesmas. Ou seja, eu claramente assumi o risco de matá-las.
Daí vem esse povo canadense me dizer que eles não apenas conseguem manter as plantas vivas, mas depois de todo cuidado, carinho e investimento feito nelas, eles simplesmente largam as plantas lá fora para congelarem nesse inverno desumano.
Eu não sei vocês, leitores, mas pra mim tem muitas coisas erradas com isso.
Primeiro, acabei de ler um livro do Dan Ariely sobre como a gente valoriza mais do que as outras pessoas as coisas que possuimos e das quais cuidamos. Por exemplo, se eu vou comprar uma mesa, o preço que estou disposta a pagar por ela é menor do que o preço pelo qual eu estaria disposta a vend6e-la. E isso ocorre simplesmente porque a partir do momento em que eu me torno proprietária, a mesa passa a valer muito mais pra mim do que valia antes, apesar de se o mesmo objeto. Se eu tiver construído a mesa a coisa fica ainda pior: vou colocar um preço ainda mais alto nela. E daí vem esse povo todo comprar plantas, colocar adubo, regar todos os dias, se certificar que a quantidade de luz está certa, ver a planta florescer e crescer. E daí eles simplesmente deixam ela morrer! Não sei o que estão ensinando para as crianças na escola aqui, mas os experimentos de economia comportamental dizem que a maioria das pessoas não iria topar uma empreitada dessas.
Segundo, acho uma sacanagem com a planta. Ela tá lá feliz e contente debaixo do Equador. Daí você promete pra ela uma vida muito melhor, dizendo que ela vai para um país cheio de adubo, com pessoas que tomam conta dela todos os dias. E quando a planta chega aqui, usufrui dessa vida maravilhosa por cinco meses, só para descobrir sua sentença de morte. Se essa planta tivesse lido o Pequeno Príncipe, tenho certeza que ela estaria lá, olhando as temperaturas cairem e te dizendo: "você se torna responsável por tudo aquilo que cativa"...
Por fim, gente que desapego é esse? Não tenho estrutura emocional pra isso. Não sei se o povo aqui é budista, ou tem alguma outra religião que permite esse desprendimento, mas eu ia precisar de muita terapia pra deixar uma planta para a qual eu me dediquei tanto morrer assim.
Me disseram que esse é o preço que se tem que pagar por flores aqui no Canadá. Pois eu me recuso a lidar com os custos financeiros, ambientais e emocionais disso. Estou, a partir de agora, em busca de plantas perenes somente. Afinal, alguém precisa ser sã nesse país.
sexta-feira, 13 de setembro de 2013
Um cantinho pra chamar de seu, Tom!
quarta-feira, 11 de setembro de 2013
Meu camundongo de estimação
A primeira vez que eu vi um camundongo foi nos Estados Unidos. Ele apareceu na cozinha de supetão. Eu tomei um susto tão grande que meu berro provavelmente foi ouvido por toda a vizinhança. Corri para um lado e o camundongo correu para o outro. Se eu estava assustada com uma criatura tão pequena, apenas posso imaginar o quanto ele estava assustando com uma criatura gigantesca e tão sonora quanto eu.
Foram algumas semanas até ele aparecer de novo. Dessa vez, eu estava sentada, jantando. Ele veio até o meio da cozinha, parou e olhou para mim. Ele parecia sozinho e faminto. Eu também estava sozinha, mas diferentemente dele, saciava minha fome com o farto prato que tinha acabado de cozinhar. E foi ali, com aquele rápido olhar, que ele conseguiu me convencer que poderíamos manter relações diplomáticas. Pra que estresse, gritos e correria, se podemos comer nosso jantar na companhia um do outro? Afinal, éramos ambos seres sozinhos e famintos. Precisámos unir forças para lutar contra esse mundo cruel.
Suas visitas tornaram-se frequentes, mas não eram diárias. Mais do que isso, eram sempre rápidas, discretas e cordiais. Talvez isso tenha evitado o desgaste da nossa relação. Nunca o Tom (achei que batizá-lo de Jerry seria pouco criativo...) começou a se servir dos minúsculos pedaços que tinha caido acidentalmente no chão sem me cumprimentar. Era sempre um olhar rápido, atento e educado, como que pedindo permissão para se servir e me desejando bom apetite. Eu silenciosamente desejava bom apetite para ele também, e assim prosseguímos, cada um com sua refeição.
Com o tempo, comecei a ver os benefícios desse animalzinho em comparação com os demais. Tomei conta do gato de uma amiga, e o bicho tinha o diabo no corpo. Subia nas partes mais altas das estantes e armários, e começava vagarosamente a puxar tudo que encontrava, até derrubar no chão. Peças quebráveis como louça, vidro e porcelana eram suas favoritas. Peças de plátisco, que não sofreriam nem causariam qualquer estrago com a brincadeira, eram solenemente ignoradas. Comprei um borrifador de água para jogar nele assim que visse que ele ia aprontar, mas quem tem tempo para ficar perseguindo um gato o dia inteiro?
Em geral tendo a preferir cachorros, mas minha experiência com os daqui da América do Norte não foram muito bem sucedidas. De novo, através de favores para amigos, acabei tomando conta de duas cadelas supostamente civilizadas. O problema é que a primeira acordava as 6 da manhã em ponto e tinha que sair imediatamente para ir ao banheiro. Como eu morava no décimo oitavo andar, isso significava que eu tinha que sair da cama, colocar uma roupa, pentear o cabelo e estar minimamente apresentável para encontrar no elevador o vizinho que também estava levando o cachorro as seis da manhã para urinar na frente do prédio.
A segunda cadela já era um pouco mais preguiçosa de manhã, mas quando acordava queria tanta atenção que eu chegava exausta no trabalho. Isso sem falar no fato de que as brincadeiras vigorosas da cadelinha em um determinado momento acabaram por incluir meu iPad. Aconteceu enquanto eu tomava banho. Assim que sai do banheiro, apenas tive tempo de ver ela, em cima do sofá, sacudindo o iPad como se fosse um ursinho de pelúcia. Antes que eu conseguisse apanhá-lo, a genial invenção de Steve Jobs planou pela sala como um aviãozinho de papel e se estilhaçou do outro lado do cômodo. Uma pena que o gato não estava lá para assistir. Ele ia ter ficado bastante satisfeito com o estrago.
Em suma, as vantagens de se ter um camundongo são inúmeras. Trata-se de um bichinho independente. Ele passeia sozinho, providencia sua comida, não te acorda em horários inadequados, não demanda sua atenção, nem exige que você providencie um banheiro ou limpe o dele. Apenas nos encontramos quando os dois querem se encontrar. Ter um camundongo é como ter um parceiro, enquanto ter qualquer outro animal de estimação é como adotar um filho. Camundongo não tem dono. Tem um companheiro. Você e ele são dois seres independentes, que encontram algo em comum e estabelecem uma relação baseada em autonomia, respeito e estima. Se a palavra "estimação" vem de estima, esse é, por essência, o único animal que merece o título de animal de estimação. E assim como o camundongo vira seu animal de estimação, você se torna o dele. É uma relação baseada em reciprocidade, como toda relação saudável deve ser.
Senti falta do Tom nos primeiros dias de volta ao Canadá, mas não demorou muito para que um primo do Tom aparecesse. Como sói acontecer em casas antigas, ele saiu debaixo do fogão ontem: um pouco menos tímido e com um pêlo um pouco mais escurinho que o do Tom, mas tão educado quanto. Já somos amigos. Agora estou tentando descobrir se tem algum jeito de compartilhar com ele um pouco do meu vinho. Sempre bom ter companhia no hora do jantar, mas companhia para beber é ainda melhor!
Foram algumas semanas até ele aparecer de novo. Dessa vez, eu estava sentada, jantando. Ele veio até o meio da cozinha, parou e olhou para mim. Ele parecia sozinho e faminto. Eu também estava sozinha, mas diferentemente dele, saciava minha fome com o farto prato que tinha acabado de cozinhar. E foi ali, com aquele rápido olhar, que ele conseguiu me convencer que poderíamos manter relações diplomáticas. Pra que estresse, gritos e correria, se podemos comer nosso jantar na companhia um do outro? Afinal, éramos ambos seres sozinhos e famintos. Precisámos unir forças para lutar contra esse mundo cruel.
Suas visitas tornaram-se frequentes, mas não eram diárias. Mais do que isso, eram sempre rápidas, discretas e cordiais. Talvez isso tenha evitado o desgaste da nossa relação. Nunca o Tom (achei que batizá-lo de Jerry seria pouco criativo...) começou a se servir dos minúsculos pedaços que tinha caido acidentalmente no chão sem me cumprimentar. Era sempre um olhar rápido, atento e educado, como que pedindo permissão para se servir e me desejando bom apetite. Eu silenciosamente desejava bom apetite para ele também, e assim prosseguímos, cada um com sua refeição.
Com o tempo, comecei a ver os benefícios desse animalzinho em comparação com os demais. Tomei conta do gato de uma amiga, e o bicho tinha o diabo no corpo. Subia nas partes mais altas das estantes e armários, e começava vagarosamente a puxar tudo que encontrava, até derrubar no chão. Peças quebráveis como louça, vidro e porcelana eram suas favoritas. Peças de plátisco, que não sofreriam nem causariam qualquer estrago com a brincadeira, eram solenemente ignoradas. Comprei um borrifador de água para jogar nele assim que visse que ele ia aprontar, mas quem tem tempo para ficar perseguindo um gato o dia inteiro?
Em geral tendo a preferir cachorros, mas minha experiência com os daqui da América do Norte não foram muito bem sucedidas. De novo, através de favores para amigos, acabei tomando conta de duas cadelas supostamente civilizadas. O problema é que a primeira acordava as 6 da manhã em ponto e tinha que sair imediatamente para ir ao banheiro. Como eu morava no décimo oitavo andar, isso significava que eu tinha que sair da cama, colocar uma roupa, pentear o cabelo e estar minimamente apresentável para encontrar no elevador o vizinho que também estava levando o cachorro as seis da manhã para urinar na frente do prédio.
A segunda cadela já era um pouco mais preguiçosa de manhã, mas quando acordava queria tanta atenção que eu chegava exausta no trabalho. Isso sem falar no fato de que as brincadeiras vigorosas da cadelinha em um determinado momento acabaram por incluir meu iPad. Aconteceu enquanto eu tomava banho. Assim que sai do banheiro, apenas tive tempo de ver ela, em cima do sofá, sacudindo o iPad como se fosse um ursinho de pelúcia. Antes que eu conseguisse apanhá-lo, a genial invenção de Steve Jobs planou pela sala como um aviãozinho de papel e se estilhaçou do outro lado do cômodo. Uma pena que o gato não estava lá para assistir. Ele ia ter ficado bastante satisfeito com o estrago.
Em suma, as vantagens de se ter um camundongo são inúmeras. Trata-se de um bichinho independente. Ele passeia sozinho, providencia sua comida, não te acorda em horários inadequados, não demanda sua atenção, nem exige que você providencie um banheiro ou limpe o dele. Apenas nos encontramos quando os dois querem se encontrar. Ter um camundongo é como ter um parceiro, enquanto ter qualquer outro animal de estimação é como adotar um filho. Camundongo não tem dono. Tem um companheiro. Você e ele são dois seres independentes, que encontram algo em comum e estabelecem uma relação baseada em autonomia, respeito e estima. Se a palavra "estimação" vem de estima, esse é, por essência, o único animal que merece o título de animal de estimação. E assim como o camundongo vira seu animal de estimação, você se torna o dele. É uma relação baseada em reciprocidade, como toda relação saudável deve ser.
Senti falta do Tom nos primeiros dias de volta ao Canadá, mas não demorou muito para que um primo do Tom aparecesse. Como sói acontecer em casas antigas, ele saiu debaixo do fogão ontem: um pouco menos tímido e com um pêlo um pouco mais escurinho que o do Tom, mas tão educado quanto. Já somos amigos. Agora estou tentando descobrir se tem algum jeito de compartilhar com ele um pouco do meu vinho. Sempre bom ter companhia no hora do jantar, mas companhia para beber é ainda melhor!
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