Fui na festinha. Conversei com
pessoas aleatórias, sobre coisas aleatórias. Daí veio a menina. Disse que
gostava de livros e das aulas na faculdade, e que conversava com os colegas
sobre os tópicos das aulas nas festinhas. “Sim, eu sou geek assim!” Eu
imediatamente começo a desviar o olhar em busca de alguém mais interessante ao
redor.
Eu conheci os verdadeiros “geeks”.
Estudei com o Renato Werneck no segundo grau – o menino que passou em primeiro lugar em todos
os vestibulares mais concorridos do Brasil, e saiu na capa da Folha e foi dar
entrevista no Jô Soares por causa disso. O Renato nunca se definiria como
“geek”. Parte do que define um “geek” é exatamente o fato de que ele não
percebe o quanto ele está fora do mundo. Ele fica lá, durante 45 minutos te
explicando porque o livro que ele leu no ultimo fim de semana está equivocado
sem notar que você nunca demonstrou qualquer interesse pelo assunto. Isso é um “geek”.
Por alguma razão que eu não
compreendo, virou moda ser “geek”. Daí “the cool kids”, as crianças bacanas,
bem ajustadas e interessantes da escola, acham que se auto-descrever como
“geek” é “cool”. Não sei em que universo essas crianças vivem, mas pra mim a
auto-declaração é o principal atestado de que você não é definitivamente
“geek”. Você chega com alguma roupa apresentável (ao invés de aparecer com uma meia
de cada cor, ou com a mesma roupa que você usou nos últimos cinco dias),
conversa olhando pra cara da pessoa, sorri, e não engata em um monólogo
auto-centrado de 45 minutos? Definitivamente sua auto-declaração não vale nada.
Sinto muito.
Eu já tinha parado de prestar
atenção no blablablá da suposta “geek” há muito tempo, quando ela mencionou que
adorava comida. Imediatamente minha cabeça estava de volta na conversa. Fiz
algumas perguntas. Ela gostava mesmo de comida. Quase tanto quanto eu.
Compartilhamos indicações de restaurantes, debatemos os pratos preferidos, e a
coisa estava até indo bem, quando a conversa passou para a metafísica da
experiência gatronômica.
A suposta “geek” me confessou que
ela sentia uma grande angústia diante de um prato perfeito. Primeiro, ela
tomava consciência de que não poderia saborear aquilo todos os dias. Depois,
contabilizava todos os obstáculos que impediriam apreciar aquilo com bastante
frequência (o restaurante era caro, o lugar era longe, etc, etc). Por fim, ela
começava a especular sobre a conjunção de fatores que tinham contribuído para
aquela experiência. E se o cozinheiro não conseguisse repetir o prato? E se ela
estava com tanta fome naquele dia que quando voltasse ali a experiência não
seria a mesma? E se a expectativa dela fosse muito alta e ela certamente se
frustaria se voltasse a comer ali? Enfim, o prato perfeito para ela era, na
verdade, uma grande tortura.
Eu, ao contrario da “geek”, não
tenho nenhuma angústia diante de um prato perfeito. O único pensamento que
passa pela minha mente é: posso morrer aqui, agora, que eu morro feliz. O prato
perfeito me dá uma sensação de realização, de completude, de finalidade.
A suposta “geek” apelidou isso de
experiência gastronômica zen budista.
Eu disse para ela parar de se preocupar
em colocar etiqueta em tudo e começar a se preocupar em viver a vida. E saí
em busca de outro copo de vinho e alguém mais interessante para conversar.
P.S. -- esse post é em parte uma homenagem a minha tia T., que fez aniversário essa semana e é definitivamente a autora das esfihas mais perfeitas que comi na vida. E é casada com meu tio, que tem seus momentos geeks, mas está sempre muito apresentável e não deixa de ter ele mesmo alguns dotes culinários altamente apreciados pela família...
P.S. -- esse post é em parte uma homenagem a minha tia T., que fez aniversário essa semana e é definitivamente a autora das esfihas mais perfeitas que comi na vida. E é casada com meu tio, que tem seus momentos geeks, mas está sempre muito apresentável e não deixa de ter ele mesmo alguns dotes culinários altamente apreciados pela família...