O esteriótipo é conhecido: acadêmico é aquela pessoa CDF (ou geek como eles preferem ser chamados). Gostam de livros, falam de coisas que ninguém entende ou pelas quais ninguém se interessa, e são geralmente mal informados sobre coisas populares como a banda que está fazendo sucesso ou o tênis da moda. Confesso que é difícil, ao menos pra mim, lutar contra esse esteriótipo. Eu de fato não acompanho a maioria das coisas que interessa à maioria das pessoas, como os últimos seriados que todo mundo anda assistindo, ou o cantor que ganhou o prêmio de música do ano passado (Emmy?) e está tocando em todas as rádios. Como eles dizem em inglês, o acadêmico não é o "average joe", para o bem ou para o mal.
Mas há uma série de esteriótipos que são mais culturais e mais geograficamente localizados. Na minha última visita ao Brasil, por exemplo, um professor universitário me dizia que se um estudante de mestrado ou doutorado dele chega para uma reunião malhado e bronzeado, ele já sabe que o sujeito não tá trabalhando. Por que?, perguntei. "Porque se você está escrevendo um mestrado ou doutorado, você fica enfurnado na biblioteca, virando noites, tomando mil litros de café e sem ter uma vida social. Tanto eu quanto todo mundo que passou por isso sabe que é assim."
É assim no Brasil, foi a minha resposta. Na América do Norte, se você está trabalhando nesse ritmo, das duas uma: ou você é muito desorganizado e deixou todo o trabalho para última hora, ou você é muito ineficiente e precisa de uma quantidade insana de horas para fazer o que alguém faria em menos da metade do tempo. Ou seja, se você está se privando de ginástica e diversão enquanto trabalhando (em qualquer coisa, não apenas na sua tese ou dissertação), você provavelmente não é tão competente quanto a pessoa que consegue balencear tudo.
E o pior é que essa visão cultural de que você tem que sacrificar sua vida pessoal para levar a sério seu trabalho vem da nossa história escravocata. Eu não lembro qual foi o pesquisador que mostrou isso -- talvez tenha sido o Sergio Buarque -- mas basicamente a escravatura distorceu nossa visão de trabalho. Os escravos não eram remunerados por produtividade. Portanto, uma vez que se comprava um escravo, havia um incentivo para que se usasse o escravo o máximo de horas possíveis. Para se poupar, os escravos faziam o trabalho devagar, para compensar pelas longas horas. O resultado disso é que nós medimos trabalho pela quantidade de horas que você se dedicou aquilo (ou pelo esforço), e não pelo resultado. Assim, o sujeito que passou 10 horas na biblioteca e escreveu 10 páginas é aplaudido, enquanto que aquele que passou 5 horas, escreveu 30 páginas, e teve tempo de ir à praia antes e ir malhar depois é visto como o cara que não está levando a sério o projeto.
Segundo, há muito pouca cultura de organização do tempo no Brasil. Portanto, o sujeito fica malhando e indo para a praia durante quatro meses e daí quando faltam dois meses para entregar a tese ele se tranca na biblioteca e não fala com ninguém. Isso é simplesmente falta de disciplina e organização. O sujeito que trabalha 5 horas por dia durante seis meses está basicamente trabalhando 900 horas (incluí aqui fins de semanas e feriados para facilitar a conta). Já aquele que resolve começar o trabalho 2 meses antes do prazo, precisa trabalhar 450 horas pro mês para conseguir trabalhar a mesma quantidade de horas que o outro trabalhou. Isso dá 15 horas de trabalho por dia. Ou seja, esse segundo aluno vai de fato ter que se trancar na biblioteca, virar noites em claro e beber muitos litros de café. Mas ele não está necessariamente trabalhando mais ou levando o projeto mais a sério que o primeito. Na verdade, o primeiro indivíduo vai trabalhar a mesma quantidade de horas que o segundo, e ainda vai conseguir ir para a praia e para a academia todos os dias.
Em suma, precisamos seriamente rever nossas concepções de seriedade e dedicação ao trabalho, especialmente na academia brasileira. Focar no resultado e não na quantidade de horas talvez nos ajude a conseguir ao menos um único prêmio Nobel.
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