No dia 14 de março eu participei pela primeira vez de uma corrida organizada. Imagine uma coisa tipo a São Silvestre: corredores com números na camisa, as ruas fechadas pela polícia para os corredores passarem, os pedestres nas calçadas, dando apoio para os corredores, e tudo mais.
Foi divertido. E eu aprendi algumas coisas interessantes.
A primeira descoberta é que virar corredor é como começar a fazer parte de uma sociedade secreta. Descobri isso quando fui correr com o running club pela primeira vez e os corredores que passavam por nós sempre nos cumprimentavam. Perguntei pro pessoal se eles conheciam todo aquele povo. Elas disseram que não. É só praxe cumprimentar outros corredores, assim como você cumprimenta as pessoas no elevador do seu prédio. Pode ser praxe, mas parece mais um ritual secreto. Parece um sinal que precisamos mandar, uns para os outros, de que nós fazemos parte desse grupo. Tanto que cumprimentamos só os corredores, mas não os transeuntes que calmamente se locomovem com seus cachorros, crianças ou celulares.
A corrida é, portanto, o dia do encontro dessa sociedade secreta. É como se todos aqueles corredores, dispersos pela cidade, que passaram meses mandando sinais uns para os outros, se reunissem em um só lugar. Os momentos que antecederam a corrida foram, portanto, como uma grande celebração, apesar de todas as condições adversas: domingo de manhã, com chuva, temperaturas próxima de zero, um vento inacreditavelmente forte (ou seja, condições sob as quais qualquer pessoa sã iria ficar na cama dormindo, sem qualquer sombra de dúvida). Estávamos todos felizes de estar lá, celebrando o fato de estar juntos e esperando como uma criança espera um doce pela corrida por vir.
A segunda coisa que eu aprendi é que tem uma coisa chamada ritmo de corrida. Antes da corrida, a T. me falou que já tinha corrido 5 Km em 27 minutos. Fiquei impressionada. Nunca consegui correr 5Km em menos de 30 minutos. E achei que durante a corrida ia ser a mesma coisa. Ledo engano. Terminei a corrida em 28 minutos e 36 segundos (para aqueles que estão curiosos pra saber como eu medi, aqui vai uma curiosidade: todos os corredores recebem uma pulseira que eles amarram no pé com um chip - vejas as fotos. Quando você cruza a linha de partida, o chip é acionado, e quando você cruza a linha de chegada o chip é desligado. E os organizadores computam os resultados e disponibilizam na internet. Não é à toa, portanto, que o evento chama-se corrida organizada....)
Fiquei surpresa quando eu vi meu tempo. Não achei que tinha corrido tão rápido (para meu padrão, é claro. Não foi nada rápido se considerarmos que o primeiro lugar chegou em 16 minutos e mais ou menos 400 pessoas chegaram antes de mim). Daí, quando eu refiz na minha cabeça a corrida, eu entendi o que aconteceu. Quando você ouvi o disparo, de repente, minha mente se focou totalmente na corrida. E toda minha competitividade veio a tona. Eu queria ultrapassar pessoas. E eu ficava com raiva quando alguém me ultrapassava. Portanto, eu corri, ainda que sem notar, no limite do meu fôlego. E foi por isso que eu consegui cortar um minuto e meio do meu melhor resultado até então. E não foi tão mal: cheguei na frente de pelo menos 2000 pessoas. Enfim, não é só o coração que tem razões que a própria razão desconhece, mas as pernas também!
A terceira coisa que eu aprendi é que depois da corrida nossa sociedade secreta vira uma grande terapia de grupo. Estamos todos nos cumprimentando pela conquista, qualquer que tenha sido ela. Aqui, toda a competitividade é substituída pelo apoio e suporte de gente que entende quão difícil é conseguir o que você acaba de conseguir. Os corredores mais experientes entendem que completar uma corrida pela primeira vez é uma conquista. E os corredores que estão completando a corrida pela primeira vez, conseguem admirar as pessoas que estão há anos voltando para aquele mesmo lugar para tentar se superar e bater seu próprio record. É como participar do alcóolicos anônimos. Se você está a um dia sem beber, nos aplaudimos. Se você está a seis meses sem beber, nós aplaudimos também. E é diferente compartilhar essas pequenas conquitas com pessoas que não passaram pela experiência. Daí a terapia de grupo.
Estou lendo um livro de um escritor japonês que corre. Ele é um escritor de ficção, mas decidiu publicar um diário das corridas dele, com algumas reflexões sobre a vida. E em uma passagem ele diz o seguinte:
"As pessoas às vezes tiram sarro de quem corre todos os dias, falando que eles percorreriam qualquer distância para ter uma vida mais longa. Mas eu não acho que é essa a razão pela qual as pessoas correm. Acho que a maioria dos corredores não corre para viver mais tempo, mas sim para viver mais intensamente. Se você vai ter que viver esses anos, é melhor viver eles com objetivos claros e completamente vivo, ao invés de passar esse tempo semi-acordado. E eu acho que correr te ajudar a fazer isso. Exigir o máximo de si mesmo dentro dos seus limites: essa é a essência de correr (e para mim, de escrever também), e uma metáfora da vida." Haruki Murakami.
Acho que isso resume bem as três lições da corrida, em especial a última.
É isso aí pessoal. Como diz uma das meninas do clube de corrida: see you on the roads!
Um comentário:
Great post, Mariana. Congratulations on finishing your first race!! You ran an excellent race, as your finishing time demonstrates. We tore up the road out there! It was great fun and even a privilege to run with you in your very first race.
The Canadian marathon runner Peter Maher wrote, "Running is a big question mark that's there each and every day. It asks you, 'Are you going to be a wimp or are you going to be strong today?'"
This winter, you proved that you are a strong runner. You ran outside in very cold weather, when most other runners stayed inside and did their workouts on treadmills. You ran through cold, snow, and rain. You've earned the right to be a part of this secret society of runners.
And so, as we say, I'll see you on the roads!
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