sábado, 11 de janeiro de 2014

O taxista londrino

A viagem foi longa. Do aeroporto até o apartamento que eu tinha alugado em Londres, daria mais ou menos uma hora, me informa o taxista. "E vai chover", adicionou ele. 

Como era de se esperar, o comentário sobre a chuva não parou ali. Recebi um relatório detalhado sobre a temperatura e a quantidade de chuvas na semana que tinha passado e uma comparação do volume de chuvas esse ano com o do ano anterior. Quando acabou o relatório sobre o tempo em Londres, comecou o relatório sobre o tempo no resto do país. Terríveis temporais e alagamentos, pessoas desalojadas de suas casas, etc, etc.

Começou a chover. Olhei no relógio: 20 minutos tinham se passado desde que saímos do aeroporto. Estava curiosa para ver se o taxista iria passar os 40 minutos restantes falando sobre o tempo. Afinal, esse é o esteriótipo, não? Ingleses conversam sobre o tempo. Pois eu já estava pronta para aprender tudo o que há para se saber sobre a previsão meteorológica de um país onde chove 90% do tempo. Será que eles teriam mais de 50 palavras para descrever chuva, assim como os Inuits (habitantes do norte do Canadá) têm para descrever a neve?

Mas para minha surpresa o taxista mudou de assunto. Tinhamos entrado na cidade e ele resolveu servir de guia turístico. Me indicava as ruas, os museus, os monumentos. Me disse que as filas nas entradas dos museums sumiriam depois do fim de semana, quando acabavam as férias escolares. Sugeriu que eu esperasse até segunda, salvo se eu gostasse muito de crianças e da companhia delas, acrescentou com uma gargalhada.... 

Daí entramos em um rua comercial movimentada. Vi algumas lojas que eu conhecia, mas o taxista fez questão de me mostrar a Harrods. Disse que eu podia comprar de tudo lá. Perguntei se era uma loja de departamento. Ele disse que sim, mas que era muito completa. Como eu não dei muita atenção para o assunto (afinal, consumo de bens não percevíveis não é um dos meus fortes), ele completou: "você pode até comprar animais na Harrods". 

Animais? Animais, respondeu ele entusiasmadamente.

E daí veio a grande história sobre a Harrods. Diz ele que antigamente a Harrods não apenas vendia animais de estimação, como vende hoje, mas vendia qualquer tipo de animal. Bastava fazer o pedido e eles traziam o que você quisesse para Londres. Zebras, girafas, elefantes, etc. Enquanto listava os animais, o nível de entusiasmo do taxista ia aumentando. Mal sabia eu a história que me aguardava!

Segundo ele, foi nesse esquema da Harrods que um sujeito resolveu comprar um leão. Criou o leão em um apartamento, até que o bicho ficou muito grande para permanecer dentro de casa. O dono resolveu então doar o bicho para uma reserva na África, onde ele viveria com outros leões, mas sob cuidados. E a história do reencontro do leão Christian com os donos foi filmada e está disponível na internet:



Disse o taxista que, ao contrário dos donos de Christian (que foram responsáveis  e mandaram o leão para um local apropriado), muitas pessoas simplesmente soltaram seus animais em território londrino. Uma boa parte delas estava tentando evitar a multa imposta por uma nova lei, que proibia a posse de animais silvestres em residências. O taxista tinha um relatório detalhado do ano e local em que vários animais exóticos tinham sido vistos por transeuntes. Eram leopardos, onças e todo tipo de bicho nas áreas rurais de Londres. As histórias eram tantas que eu não consigo lembrar de todas. Disse ele que uma parte das histórias eram mentiras, e outras eram puro engano: a pessoa vê um bicho grande, não sabe o que é, e sai pelo mundo proclamando que era uma onça.

E foi assim que eu descobri que o Londrinos não são apenas obcecados com o tempo, mas são obcecados também com histórias bizarras, como a do leão Christian e encontros inusitados com animais exóticos. Afinal, não dá pra passar tanto tempo dentro de um pub como eles passam só falando do tempo...

E a viagem terminou com uma comparação cultural: 

- "Senhor, é praxe dar gorjeta para taxistas aqui?" 
- "Algumas pessoas dão, mas não se preocupe. A gente não é como aqueles lunáticos de Nova Iorque". 

E enquanto ele descia do carro para carregar minhas malas até a porta do apartamento, eu pensei:  de fato, não são mesmo! Ainda bem.

 

2 comentários:

claudio disse...

acho que meu inglês não será suficiente para esse loooongo trajeto. vou contratar um motorista brazuca!

Maria Regina disse...

Vc conhece a Europa e esquece a América...tudo muito diferente e cativante!