quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Quando a realidade atrapalha a festa

Em fevereiro, confessei publicamente que estou usando o facebook mais do que eu gostaria de admitir. E estou mesmo. O site virou minha principal fonte de informação e contato com o mundo externo. A maioria dos meus amigos compartilham coisas que estão lendo nos jornais ou em outros sites. Portanto, ao invés de abrir três websites de jornais de manhã, vasculhando notícias interessantes, basta eu abrir o facebook e procurar a seleção de artigos interessantes que meus amigos fizeram da Folha de S. Paulo, de O Globo, e do NYTimes. Isso sem contar os artigos interessantes em sites obscuros que com certeza eu não iria ler se não estivesse na "rede social" do momento. 

Outras pessoas parecem usar o facebook para manter contato com outras pessoas, rever amigos, compartilhar fotos, dizer em que restaurante estão comendo no momento, etc. Confesso que já fiz isso algumas vezes, e a popularidade desses "posts" (se é que são chamados com esse nome) foi muito maior do que a popularidade das minhas leituras e qualquer outra coisa mais intelectualizada que eu tenha colocado. Ou seja, acho que o pessoal que usa o facebook está claramente tentando me avisar que eles preferem saber da minha vida pessoal do que saber o que eu ando lendo ou que palestras ando assistindo no TEDTalks. Tudo bem. Nunca fui popular na escola mesmo e nunca me preocupei com isso. Acho que a essa altura da vida, está um pouco tarde pra mudar o rumo das coisas...


Mas antes de ontem eu me deparei com um uso novo do facebook. Uma amiga colocou uma mensagem sobre um rapaz que havia sido sequestrado. O post tinha a foto dele, indicando nome, placa do carro e telefone para contato. E o post me intrigou. Pensei se seria possível usar o facebook de maneira efetiva para achar pessoas desaparecidas. E, para minha surpresa, a resposta foi positiva. Graças ao facebook o rapaz foi encontrado baleado em um hospital, onde tinha dado entrada como indigente por falta de documentos.  O final não foi feliz, todavia. Ele morreu. Mas hoje já tem uma outra amiga minha postando uma mensagem similar, também com foto. Diz o texto:

Gente, preciso da ajuda de vcs... este rapaz da foto é o Bruno Ribeiro, 32 anos, ele e o pai trabalham aqui comigo, e o Bruno está DESAPARECIDO desde sexta-feira, dia 14/10. Ele estava com um Honda Civic (do modelo antigo) prata, de placa COZ-1155, estava em Vila Velha a última vez q foi visto. O pai está desesperado, já procurou em delegacias, hospitais e até no IML, sem sucesso. Se alguém tiver qualquer informação é só entrar em contato comigo. Compartilhem, e desde já obrigada!

Essa pessoa claramente se inspirou na história anterior pra fazer o pedido. E pode ser que o facebook de novo entre em ação para ajudar a localizar o rapaz. Mas a pergunta que eu faço é até quando o facebook vai servir de instrumento pra esse tipo de ajuda. E minha aposta é que isso não vai durar muito tempo. O número de pessoas sequestradas no Brasil diariamente é altíssimo. Se todas as pessoas que estiverem em busca de alguém desaparecido começarem a espalhar esse tipo de mensagem no facebook, isso inundaria todas as páginas com esse tipo de mensagem. Isso, por sua vez, reduziria a disposição que as pessoas teriam para repassar a mensagem adiante. Resultado? A efetividade deste tipo de apelo tenderia a reduzir com o tempo.

Além disso, acho que as pessoas entram no facebook pra sair da realidade, não pra dar de cara com ela. Ao menos não assim, nua e crua. No facebook todo mundo está bonito, falando coisas interessantes e inteligentes, compartilhando piadas. Pra muita gente, o facebook é como uma festinha portátil, na qual você entrar e sair quando tem dez minutos livres, ou quando está de saco cheio do seu chefe e precisa espairecer. Discutir coisas interessantes nos jornais é exatamente o que eu faço quando saio com meus colegas de trabalho. E é o que eu faço no facebook. Outras pessoas preferem falar sobre um restaurante legal, sobre a última viagem que fizeram, ou sobre alguma coisa que ouviram no elevador. Independente de que tipo de animal social seja, pra todos é um momento de socialização. Agora imagine o que aconteceria se toda vez que você entrasse em um bar para tomar chopp com seus amigos entrasse uma pessoa gritando: esse rapaz foi sequestrado, ajudem a encontrá-lo, repassem o cartaz adiante. Imagine se isso acontecesse com uma certa regularidade. Aposto que você ia mudar de bar, não? 

Não me entendam mal. Não estou acusando ninguém de descaso. Todo mundo se importa com as pessoas que foram sequestradas, e gostaria que isso não acontecesse. Mas no momento em que você decide dar uma festinha na sua casa ou tomar um chopp com seus amigos, você está se divertindo. Ninguém quer, naquele momento, entrar em contato com aquela realidade em que as pessoas são sequestradas. Você quer falar de outras coisas. Você quer esquecer que sequestros existem. Aqueles que são como eu, querem engajar em conversas interessantes com pessoas inteligentes e bem informadas. Se uma pessoa fica interrompendo esse momento de diversão repetidamente com um anúncio de uma tragédia que precisa de providências urgentes e imediatas, você resolve se divertir em outro lugar. 

Em suma, minha aposta é que esse tipo de mensagem, se for usada com frequência, terá cada vez menos efetividade, apesar de ser um serviço de utilidade pública. Isso vai acontecer porque a razão pela qual as pessoas estão no facebook é outra. É socializar. A pergunta que fica é se esse tipo de mensagem vai morrer por falta de audiência, ou se elas vão afogar o facebook e as pessoas vão decidir fazer a festinha em algum outro lugar. 

Façam suas apostas. 

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